A Tarifa Social de Água e Esgoto e a Lei 14.898/24: Avanços e Desafios para a Garantia de Direitos Humanos

Por João Batista Costa – Consultor Jurídico da UVESP

 

A Lei 14.898/2024 representa um marco importante na luta pela universalização do acesso aos serviços de água e esgoto, ao instituir diretrizes nacionais para a tarifa social. De acordo com a nova legislação, famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) ou beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada (BPC) têm direito a pagar, no máximo, 50% da tarifa residencial comum. Essa iniciativa contempla mais de 29 milhões de famílias brasileiras, o equivalente a um terço da população, segundo dados apresentados pelo deputado Joseildo Ramos.

A Importância da Lei para os Direitos Humanos

 O acesso à água potável e ao saneamento básico é reconhecido como um direito humano essencial pela Resolução 64/292 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 2010. A Lei 14.898/2024 reflete esse compromisso ao garantir que famílias em situação de vulnerabilidade não sejam excluídas de serviços essenciais por incapacidade de pagamento.

A Constituição Federal, em seu artigo 6º, inclui o saneamento básico entre os direitos sociais fundamentais, reforçando que o Estado tem o dever de implementar políticas públicas que assegurem dignidade às populações em situação de risco. Além disso, o artigo 3º da Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, já previa a possibilidade de tarifas sociais como forma de assegurar a equidade no acesso a esses serviços. A nova legislação complementa esse arcabouço normativo ao fixar critérios e parâmetros claros para a aplicação desse benefício.

Desafios para a Efetividade da Lei 14.898/24

 Embora a Lei 14.898/2024 represente um avanço significativo, sua plena implementação depende de regulamentação e articulação entre diferentes esferas de governo e sociedade. Entre os principais desafios, destacam-se:

1.    Definição de Competências

É imprescindível que a regulamentação da lei estabeleça as competências de cada ente federativo, garantindo a uniformidade na aplicação da tarifa social. Conforme o artigo 23 da Constituição, o

saneamento básico é uma competência comum entre União, Estados e Municípios, exigindo esforços conjuntos para evitar sobreposição de funções ou lacunas na execução.

2.    Articulação Interministerial e Controle Social

A implementação eficaz da tarifa social requer uma forte articulação entre ministérios, como o de Desenvolvimento Social, o de Cidades e o de Meio Ambiente, além de conselhos nacionais e movimentos sociais. Esses atores são essenciais para assegurar o acompanhamento das políticas públicas e promover o controle social, como preconizado pelo artigo 9º da Lei 11.445/2007.

3.    Identificação dos Beneficiários

A base para concessão do benefício é o Cadastro Único e o BPC, mas é necessário investir em estratégias para identificar e cadastrar famílias que ainda se encontram fora desses programas, especialmente em áreas de difícil acesso.

4.    Financiamento e Sustentabilidade Econômica

A sustentabilidade econômica das empresas prestadoras de serviço é um ponto sensível. O artigo 29 da Lei 11.445/2007 estabelece que as tarifas devem assegurar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, o que exige a criação de mecanismos de compensação para as perdas de receita das concessionárias em função da tarifa social.

Estratégias para a Implementação Efetiva

 Normatização Local: Municípios e estados devem adequar sua legislação às diretrizes da Lei 14.898/2024, criando normas específicas para regulamentar o benefício e detalhar os procedimentos administrativos necessários.

  • Capacitação e Monitoramento: Conselhos municipais e estaduais de saneamento básico devem ser capacitados para acompanhar a implementação da tarifa social, garantindo que os objetivos da lei sejam alcançados.
  • Transparência e Participação: A criação de mecanismos de transparência e participação popular é fundamental para assegurar a eficácia da lei e evitar desvios ou exclusões indevidas.

Conclusão

 A Lei 14.898/2024 é um avanço significativo no combate às desigualdades sociais e na promoção do direito ao saneamento básico. Contudo, sua efetividade depende de regulamentação robusta, articulação entre os diversos atores envolvidos e fortalecimento dos mecanismos de controle social.

Como consultor jurídico da UVESP, reitero a importância de que estados e municípios estejam atentos às diretrizes estabelecidas pela lei,

promovendo sua implementação de maneira célere e eficaz. Garantir o acesso à água e ao esgotamento sanitário a preços acessíveis é mais do que uma medida econômica; é um compromisso com a dignidade humana e com o futuro sustentável do Brasil.

Novembro / 2024

 

João Batista Costa

Consultor Jurídico – UVESP | OAB/SP 108.200

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