Em entrevista, o Subprocurador-Geral comentou sobre sua carreira e as relações do MP com os poderes
Nos últimos anos, o Ministério Público vem buscando fortalecer seu vínculo com todas as esferas de poder, as administrações públicas e seus servidores. Isso reforça seu papel de desenvolver uma justiça eficiente e democrática para a sociedade civil.
Um dos nomes que se destacam neste movimento é o de José Carlos Cosenzo, que atualmente ocupa o cargo de Subprocurador-Geral de Políticas Criminais do MP. Cosenzo é natural de Nova Itapirema, pequena cidade próxima a São José do Rio Preto, em São Paulo. Formado em Direito pela Faculdade de Direito Riopretense, exerceu a advocacia antes de ingressar no MPSP.
Em entrevista ao Jornal do Interior, o Subprocurador-Geral fala sobre sua carreira, além de explanar sobre a importância da instituição e seus atuais desafios.
JI – O que o motivou a ingressar na carreira jurídica e, mais especificamente, no Ministério Público?
Concluído o curso de direito e inscrito na OAB, comecei a advogar na região de São José do Rio Preto, pois residia em José Bonifácio, cidade próxima. No início, recebíamos nomeações para assistência judiciária gratuita, defendendo os acusados na área criminal e patrocinando interesses de pessoas consideradas pobres, no âmbito civil.
Foi nesse período, muito antes da Constituição, que conheci a atuação intensa do Ministério Público no atendimento às pessoas carentes, defendendo seus direitos, cuidando dos menores, fiscalizando a administração pública, as eleições, mantendo contato direto com a sociedade e buscando a punição dos infratores da lei, principalmente no Tribunal do Júri.
Sempre gostei de conviver com o povo, com a sociedade e ver o poder público atuando de forma correta na distribuição da justiça, fatores que certamente me inspiraram e motivaram a estudar para ingressar na carreira. Felizmente consegui.
JI – Como avalia a importância e o papel do Ministério Público na sociedade?
É sempre importante repetir que dentre todas, o Ministério Público foi a instituição que mais recebeu poderes na Carta de 88. Da mesma forma, é necessário realçar que o período constituinte foi um dos momentos mais ricos da história do país, que respirava democracia e aspirava mudanças sociais e humanas, e que a atuação intensa do MP foi essencialmente no sentido de se criar uma instituição forte e independente.
Se você imaginar que em todas as áreas de interesse social o Ministério Público deve atuar, como saúde, educação, segurança, meio ambiente, esporte, habitação, infância e juventude, pessoa portadora de deficiência, combate ao racismo e a violência contra a mulher, etc, além da exclusividade da ação penal pública incondicionada, concluirá que o perfil de instituição permanente e de fiscal do regime democrático é fundamental para a imposição dos demais fundamentos constitucionais.
JI – Quais são suas opiniões sobre a independência e autonomia do Ministério Público?
São princípios do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. Sem independência a instituição não consegue aplicar as leis, e sem autonomia não conseguirá ter a menor condição estrutural humana e material. A independência funcional é a garantia constitucional para o membro da instituição atuar sob o limite da legalidade, sem sofrer pressão interna ou externa.
Por outro lado, há necessidade da instituição, mesmo respeitando tal princípio, buscar uma uniformidade de entendimento através de súmulas e enunciados. A garantia da manutenção de todas essas conquistas na Carta de 88 deve acontecer através da atuação qualificada na defesa da sociedade e da democracia, com o rigor da lei e sem excessos, além do permanente diálogo com os demais integrantes do sistema de justiça e os poderes Legislativo e Executivo.
É inimaginável, no mundo atual, onde os fatos são conhecidos em tempo real, você fragilizar a defesa da sociedade. Por isso, todas as vezes em que sofremos investidas dessa natureza, vem a tona a pergunta: “a quem interessa retirar poderes do Ministério Público?”. A resposta é o óbvio: só os inimigos do povo!
JI – Como vê a relação entre o Ministério Público e os demais poderes e instituições do sistema de justiça?
Nenhuma instituição pode ser um fim em si mesma, pois conforme dispõe a CF de 88 no seu artigo 2º, os poderes da União são independentes e harmônicos entre si, e isso significa simplesmente que não pode haver invasão em suas competências, mas devem atuar de forma coerente, simétrica e em paz.
Mesmo não sendo um poder formal, somos destinatários das mesmas prerrogativas e garantias da magistratura, temos mecanismos legais para administrativamente elaborar orçamento, propor criação de cargos e projetar o crescimento e políticas de atuação. Isso resulta em harmonia, visando aperfeiçoar a atuação do sistema de justiça.
Hoje a chefia institucional mantém diálogo permanente, sadio e cordial com o Governo do Estado, Assembleia Legislativa e Tribunal de Justiça, proporcionando maior tranquilidade social e resolutividade.
JI – Como avalia a eficácia do Ministério Público na promoção da justiça e no combate à corrupção?
No que se refere à promoção da justiça, podemos assegurar que a lição de casa está sendo feita com muita qualidade e responsabilidade, seja na defesa dos direitos difusos e coletivos, seja na área criminal. Quase a totalidade das ações civis públicas ajuizadas no país tem como autor o Ministério Público, com resultados sociais altamente satisfatórios.
No combate à corrupção, nossa atuação é intransigente, mas o seu enfrentamento é complexo. A corrupção é um problema extremamente perverso, pois está interligada a vários fatores, exigindo de quem a combate, um conhecimento aprofundado sobre as várias causas, consequências e impacto para enfrentá-la com possibilidade de vencê-la. O que não se aceita é o passar do tempo passivamente, fator que propicia um ambiente de aceitação na sociedade, auxiliando o seu crescimento.
O Ministério Público a cada dia busca a criação de ferramentas e aperfeiçoamento na atuação, com laboratório técnico para análise de provas, peritos, tecnologia nas buscas e constante atualização dos seus membros e setores específicos.
JI – Quais são as mudanças ou reformas que você acredita serem necessárias para fortalecer e aprimorar o trabalho do Ministério Público?
A sociedade seria outra se pudéssemos, em nosso país, pleno de riquezas naturais, ser menos desigual e proporcionar maior acesso aos direitos sociais. Uma maneira de fortalecer, não apenas o Ministério Público, mas a própria segurança jurídica, é a ampliação do debate com os agentes políticos.
Não é, e nunca foi nosso interesse a criminalização da política, da mesma forma que a judicialização indiscriminada de ações. Não é função do Ministério Público determinar condutas ou ações que são postas pela Constituição Federal, mas sim apurar desvios.
O bom administrador acolhe os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Política é ação que visa o bem comum, é a ciência que tem por objetivo a felicidade humana, é o meio mais profícuo para transcender a democracia.